sexta-feira, 11 de outubro de 2019

A falta de Steve Jobs



Do computador pessoal ao smartphone, da internet comercial à música e vídeo digital, do mouse à tela de toque, há o dedo de Steve Jobs em praticamente todas as fases da revolução digital

por Pedro Doria | O Estado de S. Paulo

No último sábado, dia 5, fez oito anos que Steve Jobs morreu. E, oito anos depois, ele segue insubstituível. Nenhum líder no Vale do Silício chegou sequer próximo. E é curioso, pois como cresceu sua Apple, desde então. Era impensável, naquele 2011, que uma das maiores empresas do mundo — eram bancos e petroleiras — alcançasse o valor de mercado de US$ 1 trilhão. Mas a Apple está nessa faixa, e não sozinha. Caminham junto, e a ordem varia de acordo com o tempo em Wall Street, Microsoft, Google, Amazon e Facebook. Pois é. Mas, apesar deste sucesso posterior, ninguém chega próximo de Jobs.

Tecnologia é uma coisa tão óbvia, hoje em dia, tão parte dos nossos cotidianos. E porque tem tanta gente por aí com iPhones, iPads ou iMacs, o nome de Jobs se tornou um daqueles tão célebres que, não importa em qual canto do mundo, todos ouviram dele.

Mas, no Vale, sua mística é antiquíssima. Nos anos 1980, ali por Cupertino, Mountain View ou Palo Alto, havia Apple IIs por toda parte. Nas escolas, nos escritórios. Histórias de Steve Jobs eram contadas com admiração. Nenhum outro líder da indústria era visto como ele. Sim: temperamental. Sim, um chefe difícil para muitos, dado o tipo de bronca que passava. Mas todos sabiam que Jobs era extraordinário.

Quando no Vale dos anos 1970 um grupo de seus amigos montava computadores por diversão nas garagens, ele percebeu que um destes, bem-acabado, seria um produto com enorme potencial de mercado. Imagine só: um computador pessoal.

Quando percebeu a tecnologia que a Xerox havia desenvolvido, incluindo ícones e janelas, uma lata de lixo na tela, e tudo guiado por este apetrecho que ninguém conhecia — o mouse —, Jobs pagou um dinheiro para poder copiar. A Xerox não ligava, então foi ele, com o Mac, que pôs nas ruas o primeiro computador fácil de aprender a usar.

Expulso da Apple por ser temperamental, montou uma empresa que produzia os computadores mais bonitos jamais feitos. E bons de matemática: os NeXT. A World Wide Web foi inventada num destes. E o sistema da NeXT era tão bom que uma Apple próxima da falência comprou a empresa para tentar salvar o Mac. Levou de brinde Steve Jobs. Que em meses virou CEO.

De volta à empresa que fundara, pôs nas ruas o iMac, um computador já pronto para entrar na internet — era só ligar ao fio do telefone. (Funcionava assim naquele tempo.) Um computador cheio de curvas e num azul translúcido que permitia ver o interior. Eram todos beges e quadrados, os computadores.

Aí pôs na rua o iPod e, de repente, podíamos nós circularmos por aí com todos os discos da coleção gravados para ouvirmos.

Então reinventou o telefone celular. E veio o iPad. Neste meio tempo, reinventou o negócio da indústria da música, criando pelo iPod e depois o iTunes, a primeira loja digital de música. Para depois vender online também filmes e séries.

Do computador pessoal ao smartphone, da internet comercial à música e vídeo digital, do mouse à tela de toque, há o dedo de Steve Jobs em praticamente todas as fases da revolução digital. Nenhum executivo, nem Bill Gates, chega perto desta marca.

Os seus eram dois talentos. O primeiro era a visão. Tecnologia é coisa que se inventa, se cria do nada. Jobs intuía como aqueles chips e telas poderiam atender a usos que consumidores sequer imaginavam, mas pelos quais se encantariam. E tocava esta sua visão com rigor estético que herdou de sua religião, o Zen. O segundo talento era o da venda. Ela sabia explicar a visão que tinha de forma que parecesse óbvio.

Porque era óbvio depois que ele mostrava. Ninguém chega perto.

Um comentário:

  1. Texto sensacional. Parabéns.

    Era mesmo único, inventava e depois reinventava tudo.

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