Jornal do Brasil Arnaldo Niskier
A discussão sobre a sobrevivência do livro impresso está muito acesa. Em parte, é reflexo do que acontece nos países mais desenvolvidos, onde há uma oferta progressiva de e-books. Aqui entre nós, por enquanto, o crescimento é lento. Em todo o comércio eletrônico nacional, não há mais de 7 mil títulos disponíveis. Para se ter ideia da discrepância dos números, só a Amazon conta hoje com cerca de 950 mil títulos.
Há um pormenor que é próprio do mercado brasileiro: o Kindle começou com um gás assustador, mas não pegou por causa do preço, hoje em 800 reais. Pelo dobro, pode-se ter um equipamento muito mais completo, que serve para navegar na internet, tirar fotos, gravar vídeos etc. O custo benefício é muito mais atraente.
Estamos vivendo uma fase de incríveis conquistas tecnológicas, especialmente no campo das comunicações. O que não significa a morte das versões anteriores. Diziam que o rádio acabaria com os jornais; o cinema acabaria com o teatro; a televisão acabaria com o rádio, e a internet acabaria com todas as mídias citadas. Na realidade, nada disso aconteceu. Convive-se com todas essas manifestações, embora se saiba que a escala é outra: no facebook há 900 milhões de membros, e o twitter abriga 150 milhões de usuários (o youTube tem praticamente tudo).
Vivemos uma fase de absoluta perplexidade, mas um homem com a experiência do Boni, por exemplo, afirmou, em lançamento recente, que a TV aberta tem um longo futuro à sua frente, desde que se renove e passe a programar atrações ao vivo e promover transmissões diretas. Devemos estar atentos a essas peculiaridades, para que nada se perca dessas imensas conquistas.
Fala-se muito nos e-books, mas as grandes companhias brasileiras, tipo Livraria Cultura, não passam de 1% do faturamento na venda de livros eletrônicos. Há uma longa caminhada, com um detalhe que me ocorreu na visita feita à Real Academia de Espanha: os autores do seu vocabulário têm 90 mil livros impressos sobre linguística, consultados diariamente. Isso vai desaparecer? Sinceramente, não acreditamos. E a Biblioteca do Congresso Americano? E a da Universidade de Berkeley, onde há uma quantidade enorme de livros brasileiros? Quem preconiza o fim disso tudo, sinceramente, está equivocado.
O que se pode prever é que haja, por muitos e muitos anos, uma coexistência pacífica entre livros de papel e e-books, como antecipou o escritor Umberto Eco. Segundo ele, somos 7 bilhões no mundo, mas uma parcela ínfima desse total tem acesso aos computadores. Vai demorar muito para mudar esse quadro. Para Umberto Eco, “temos a prova científica de que um livro pode durar 550 anos. Jamais deixaremos de ter, com essas obras, uma relação física, carnal, afetiva. É muito difícil ler Guerra e paz num e-book. De mais a mais, a internet não filtra nada – e esse é um mal”. Estamos certos de que, na nossa geração e possivelmente em muitas outras, ainda viveremos na boa companhia dos livros impressos.
Arnaldo Niskier, membro da Academia Brasileira de Letras, é presidente do CIEE/Rio e doutor em educação
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