terça-feira, 3 de março de 2020

Este site reúne a versão digital de 20 mil fitas VHS

Cesar Gaglioni - Nexo

Parte da plataforma The Internet Archive, acervo reúne a gravação de diversas programações televisivas

FITAS VHS TIVERAM SEU AUGE NOS ANOS 80 E 90

O site The Internet Archive surgiu em 1996, nos primeiros anos da internet, com o objetivo de criar um acervo digital da própria web, preservando sites, páginas e publicações.

Além de preservar a história da internet, o site também conta com um acervo para registrar a história da cultura pop. Trata-se do The VHS Vault, uma seção da plataforma que traz a versão digital de fitas VHS.

Entre as digitalizações estão comerciais, programas, telejornais e até mesmo a exibição de filmes na TV aberta. Ao todo, são cerca de 20 mil títulos disponíveis gratuitamente (a maioria é de produção dos EUA).

Uma das fitas mostra um show da dupla folk Simon & Garfunkel no Central Park, em Nova York. Uma outra, mostra um especial do canal americano NBC para divulgar os parques de Walt Disney, em Orlando, na Flórida. Há também a gravação da transmissão completa do Oscar de 1998, quando “Titanic” levou 11 estatuetas, incluindo Melhor Filme.

O The VHS Vault permite que qualquer usuário disponibilize novas fitas, aumentando o acervo gradualmente.

Uma breve história do VHS
Muito antes da guerra dos streamings, o VHS era a principal forma de se consumir conteúdo audiovisual em casa sem depender dos canais de TV.

A tecnologia surgiu no Japão em 1976, e se espalhou para o mundo em 1977. As fitas de VHS eram feitas de plástico e, em seu interior, tinham uma fita magnética no qual o conteúdo era gravado.

As fitas VHS tiveram seu auge nos anos 1980 até meados da década de 1990, quando surgiram os DVDs, discos digitais que conseguiam armazenar mais tempo de vídeo com uma qualidade melhor.

Os DVDs ocuparam o mercado massivamente durante a primeira década dos anos 2000 e foram substituídos pelo blu-ray, um disco similar, mas com ainda mais qualidade, e posteriormente pelas plataformas de streaming.

sábado, 29 de fevereiro de 2020

Panfleto visionário



“O perigo não está nas máquinas, senão teríamos de sonhar o absurdo: destruí-las pela força, à maneira dos iconoclastas que, ao quebrar as imagens, se vangloriavam de aniquilar também as crenças. O perigo não está na multiplicação das máquinas, mas no número crescente de homens habituados desde a infância a desejar apenas o que as máquinas podem dar” George Bernanos em "A França contra os robôs" (1945)

terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

Preprint Archive Search: uma descoberta para todas os preprints do projeto OSF


O Preprint Archive Search é uma ferramenta de descoberta do OSF que permite pesquisar coletivamente todos os repositórios do projeto OSF Preprints. Também podemos selecionar por arquivo e também por assuntos ou áreas de conhecimento. O repositório contém atualmente 2.250.305 documentos


segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

Como sobrevivem as últimas videolocadoras de São Paulo na era do streaming

Evanildo da Silveira
De São Paulo para a BBC News Brasil

No auge, locadoras de vídeo somaram cerca de 4 mil lojas em São Paulo

O fotógrafo baiano João Alvarez passeava pelo centro de São Paulo há cerca de um ano quando se deparou com uma raridade: uma locadora de filmes, uma das últimas ainda existentes na capital paulista hoje.

Localizada no edifício Copan, projetado por Oscar Niemayer e um dos cartões postais da cidade, a Vídeo Connection é uma prova de que ainda é possível alugar filmes em lojas físicas — especialmente os clássicos e os mais antigos, que de outra forma estariam perdidos para sempre para os amantes do cinema e para as novas gerações. A maioria deles, dizem donos de locadoras e aficionados, não está disponível nos serviços de streaming nem em outras plataformas.

A videolocadora do Copan é uma das poucas sobreviventes entre as mais de 4 mil que já existiram na maior metrópole da América do Sul. Elas persistem e ocupam um nicho específico de mercado, atendendo clientes como Alvarez. "Eu sou um amante do cinema", diz ele. "Meu principal hobby é ver filmes. Eu e minha mulher assistimos a cinco por semana, em média. Acho que não podemos ficar reféns do streaming, pois os melhores filmes de arte e os clássicos não estão ali. Eles só são encontrados nas locadoras."

A história das locadoras de filmes em São Paulo — e no Brasil — começou no final da década de 1970. A primeira da capital paulista surgiu em 1977. Inaugurada como Disk Filmes, tornou-se, um ano depois, a conhecida Omni Vídeo.

"No mesmo ano e ao mesmo tempo surgiu o primeiro videoclube do país, chamado justamente Vídeo Clube do Brasil'", conta o cineasta Alan Oliveira, autor do documentário CineMagia: A História das Videolocadoras de São Paulo, lançado em 2017.

As lojas ganharam destaque no início da década de 1980, momento em que o videocassete começou a se popularizar no país. As redes 2001, Real Vídeo e Vídeo Norte, por exemplo, surgiram em 1982.

Daí para frente, começou o boom das videolocadoras em São Paulo e em todo o Brasil. "Nós mostramos esse processo no filme, que envolve a transformação do mercado de fitas alternativas (VHS gravadas) para as seladas (originais das distribuidoras), seguindo para a chegada do DVD em 1997", diz Oliveira.

O auge das locadoras se deu exatamente nesse período de mudança de tecnologia, do analógico para o digital. De acordo com o autor de CineMagia, o avanço na qualidade de imagem e som trazido pela chegada do DVD fidelizou clientes de maneira inédita no mercado.

Videocassete começou a se popularizar no país no início da década de 1980

Isso se seguiu até 2006, com a chegada do blu-ray, uma tecnologia ainda mais poderosa que o DVD, mas que não chegou a decolar no país.

Prejudicadas pela popularização dos downloads de filmes e dos DVDs piratas, as locadoras começaram a fechar logo em seguida. A chegada das plataformas de streaming no país, a partir de 2011, só intensificou esse movimento, segundo Oliveira.

"Vendo tudo isso acontecer, senti a necessidade de documentar essa história", revela. "Não o processo de fechamento delas, mas sim a magia que existia (e ainda existe) na experiência de entrar nesses maravilhosos espaços urbanos de cinefilia."

"O documentário 'CineMagia' é uma homenagem a esses 40 anos do mercado de home video, começando em 1976 e seguindo até 2016", conta.

"Mais do que falar sobre 'um suposto fim' [das locadoras], minha ideia sempre esteve voltada para o começo. Sempre tive fascínio em entender como a coisa toda nasceu e se transformou com os avanços da tecnologia ao longo dos anos. Está tudo lá no filme."

Auge
É difícil saber exatamente o número de videolocadoras que existiram nesse período. "O cálculo que fizemos para o filme levou em consideração a listagem de lojas que realizavam compras de filmes (VHS e DVD) das principais distribuidoras do país, no período de dezembro de 1998 a fevereiro de 1999", diz o diretor.

"A cidade de São Paulo tinha cerca de 4.000 listadas e, no país, cerca de 11.500, sendo mais de 900 cadastradas apenas em 1998. Isso dá uma dimensão da velocidade e do crescimento do negócio e das vendas naquele período."

É claro que esse número oscilou muito até 2006, quando a maioria das lojas e algumas distribuidoras começaram a encerrar seus serviços. Nessa mesma época, o Rio de Janeiro tinha cerca de 1.600 estabelecimentos, praticamente a metade do número da capital paulista.

Fotógrafo baiano João Alvarez é amante do cinema e assiste, ao lado da mulher, a cinco filmes por semana

Hoje, a Vídeo Connection é uma das raríssimas videolocadoras de São Paulo que vivem exclusivamente da locação de filmes e da conversão de fitas VHS para DVD.

A história da loja começou em 1985, quando foi inaugurada na rua da Consolação, região central de São Paulo, com 120 títulos em VHS. "Nós pegávamos os filmes na Omni Vídeo, copiávamos e colocávamos para alugar", conta o dono da empresa, Paulo Sérgio Baptista Pereira. "Depois, começamos a trabalhar também com filmes pornôs, para atender os motéis."

Em 1986, a empresa começou a atuar também como revendedora de filmes, adquiridos diretamente nas produtoras. "Fomos a primeira distribuidora do Brasil para outras empresas", diz.

"Passamos a crescer muito e separamos a locadora, que instalamos aqui no Copan. Abrimos novas lojas, muitas delas dentro de grandes empresas, chegando a ter 15 no total. Isso foi até 1995, quando o cenário começou a mudar e o número de estabelecimentos passou a diminuir."

O surgimento do DVD, porém, reverteu esse movimento e gerou nova disparada no número de lojas. O bom momento durou até cerca de 2010, quando começou a pior fase deste mercado. "A pirataria já estava pesada, mas não chegou a comprometer nosso negócio", diz Pereira. "O que atrapalhou mesmo foi o streaming, que chegou com força a partir de 2012. Cheguei até pensar em fechar a loja."

55 cópias de 'Titanic'
Foi em 1995 que Gilberto Donizetti Petruche resolveu realizar o antigo sonho de montar uma videolocadora, no ano. Largou o emprego numa grande empresa, na qual era gerente administrativo, para fundar o Centro Cultural Videolocadora Charada, em Sapopemba, zona leste de São Paulo.

Ele alugou uma sala perto de sua casa e inaugurou a loja, sob o nome provisório de Vídeo Clube Ação, com 294 títulos. "Meu grande objetivo era ser mais do que uma locadora, ou seja, ser um clube", conta Petruche.

"A ideia era exibir filmes, fazer debates, conversar. Mas não deu certo, porque o movimento das locações foi tão grande que a ideia de clube ficou em segundo plano. Não dava tempo de conversar com os clientes. Tivemos que alugar um espaço maior. Atingimos o auge no dia 2 de janeiro de 2000, quando locamos, num único dia, 880 fitas VHS. Nessa época, a média era de 300 filmes por dia. Cheguei a comprar 55 cópias do filme Titanic."

O DVD, que a Charada começou a disponibilizar a partir de 2001, deu sobrevida à loja. A queda começou há cerca de 10 anos, quando o número locações diminuiu para 1.000 por mês.

"De 5 anos para cá, a redução foi ainda maior", diz Petruche. "Hoje, alugamos cerca de 100 fitas por mês. Então, voltamos à ideia inicial e a locadora virou um clube. Vendemos discos de vinil, oferecemos aulas de violão, guitarra, bateria e realizamos shows."

Dez anos mais antiga, a Televideo, localizada no Belenzinho, também na zona leste de São Paulo, e inaugurada em 1985, tem uma história semelhante.

No auge, chegou a alugar 3.000 filmes por mês. "Hoje, nosso movimento é insignificante perto do que já foi", conta o proprietário, Marcelo Martins.

Advogada Christina Nobre aluga filmes semanalmente na Televideo

"Em um final de semana bom, locamos cerca de 25 filmes. Por isso, ao longo dos últimos anos, mudei o foco do meu ramo, passando a ser mais uma loja de conveniência do que uma simples videolocadora. Vendo sorvetes, doces, bolachas, presentes, bebidas, produtos para informática, acesso à internet, impressões de boletos, currículos, fotos. Só continuo comprando os lançamentos ainda pela paixão que tenho pelo cinema."

Sorte de clientes fiéis, como a advogada Christina Fernanda Cobianchi Nobre, que há mais de 10 anos retira filmes semanalmente na Televideo. "Eu gosto de lojas físicas, porque posso ver as opções nas prateleiras, pegar a capa do vídeo e ler o resumo", diz. "Além disso, há títulos que a gente só encontra em locadoras, principalmente antigos, que a geração de hoje não conhece. Não podemos deixar isso morrer."

Para Pereira, as videolocadoras experimentam, atualmente, um pequeno aumento do movimento e do interesse das pessoas. "Quando elas perceberam que nem tudo o que queriam estava disponível no streaming ou na internet, começaram a voltar às lojas", explica.

"Como estou praticamente sozinho no mercado paulistano, meu movimento voltou a crescer a partir do final de 2017 e no início de 2018. No auge, por volta de 1995 e 1996, chegamos a ter 4.000 locações num mês, número que caiu para cerca de 300 ou 400, em 2016. Agora, chegam a 800 mensalmente. Estou sem funcionários, mas até estou pensando em contratar alguém."

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

O mundo da precariedade


Dados pessoais passaram a ser o novo petróleo. Sua privacidade está sendo negociada agora

       
Marcelo Rubens Paiva, O Estado de S.Paulo
Imagem: Internet


Outro dia, numa sorveteria de alto padrão, vi uma menina chegar numa bike alugada do Itaú, com uma mochila verde-limão da Uber Eats, para levar um pedido feito via iFood. Tem maluco que compra sorvete via aplicativo. E ela fatura. Quanto? Menos do que mil reais, trabalhando 12 horas por dia. Mas melhor do que ficar em casa, disse. Se cair e bater a cabeça num poste, fica.

O capitalismo repete na Revolução Tecnológica a crise que alimentou na Revolução Industrial: colapso nos mercados financeiros, bolhas nas bolsas, desemprego alarmante, miséria, fome, descrédito do regime de representações, ondas de imigração, uma desigualdade social escandalosa e, acima de tudo, precariedade no trabalho.

A era dos magnatas (Andrew Carnegie, rei do aço, John D. Rockefeller, barão do petróleo, Jay Gould, das ferrovias, e J. P. Morgan, banqueiro), que inventaram a chamada “supereconomia americana”, segundo Charles Morris (em O Magnata), levou os Estados Unidos à liderança: país mais rico em renda per capita, disponibilidade de recursos naturais, produção industrial, valor das terras produtivas e fábricas, com excedente a ser exportado. 

Seus inovadores nasceram pobres. Venderam a noção da terra das oportunidades, num sistema econômico democrático e livre em que só isso era possível, em contraste com uma Europa decadente e aristocrática, em que a herança sanguínea tinha mais valor do que visão para os negócios.

Logo, a insatisfação popular, com o desemprego da automação e a pobreza, levou democracias a entrar em crise. O mundo enlouqueceu, fanatizou-se. Nasceram regimes autoritários e ressentidos, em que o Estado era tudo, o indivíduo, nada: nazi-fascismo, salazarismo, franquismo. Ditaduras avançaram sobre a Itália, Alemanha, Grécia, Portugal, Espanha e em todo Leste Europeu. E, o pior de tudo, o nacionalismo vingou. Para piorar, mergulhamos em guerras globais. 

A dinâmica do capitalismo europeu logo encontrou uma solução: o Wellfare State. Aliou-se a fortes estruturas sindicais, tornou saúde e educação gratuitas e protegeu seus cidadãos desempregados, deficientes, perseguidos, aposentados. Cedeu em negociações trabalhistas. O sistema avançou. Direitos civis e o respeito aos direitos individuais passaram a ser política de Estado. O mundo caminhou para uma utopia social-democrata. Até...

Nos anos 1960 nasceu a Arpanet, projeto militar para interligar computadores via linha telefônica. Em caso de ataque nuclear, o presidente americano teria como se comunicar com seu sistema de defesa e acionar a retaliação.

Com a popularização do computador pessoal e um sistema operacional eficiente, nasceu a internet, o algoritmo, que virou o mundo do avesso. Mergulhamos numa nova crise capitalista: de novo precariedade no trabalho e desemprego, nacionalismo, desigualdade social e ascensão de líderes autoritários. Cada país vem em primeiro ou está acima de tudo.

No Brasil, pesquisa do IBGE revela que o rendimento total dos 10% mais ricos é superior à soma dos 80% mais pobres, numa desigualdade recorde (1% mais rico tem 33 vezes mais que 50% mais pobre).

Novos magnatas surgiram. Que também não nasceram em berço de ouro e fugiram da faculdade. Dados pessoais passaram a ser o novo petróleo. Sua privacidade está sendo negociada agora. Quem fatura? Acionistas.

Herton Escobar descreveu: “Achamos que pesquisamos no Google, mas agora entendemos que é o Google que nos pesquisa. Achamos que usamos as mídias sociais para nos conectar, mas aprendemos que são as mídias sociais que nos usam”.

Adoramos aplicativos. Pouco a pouco, deixamos de comprar abajures nas lojas da rua de lustres e compramos via Amazon. É mais prático, barato, tem nosso cadastro, uma inteligência artificial que sabe tudo o que queremos, mais opções e nos brinda com um streaming com música, séries e filmes. 

Deixamos de frequentar negócios familiares, como livrarias, lojinhas de bairro, e resolvemos rapidamente com nosso celular. O supermercado entrega no dia seguinte. Comida? Tem um aplicativo que engloba quase tudo, e, malandro é malandro, agora vende um PF (prato feito) pela metade do preço dos PFs da redondeza.

Negócios falem. Viramos entregadores. Até drones, robôs e veículos autônomos acabarem com nosso bico.

Na série Years and Years (HBO), que, como o nome diz, acompanha 15 anos da família Lyons do Reino Unido, unida e exemplar (com um casal multiétnico, outro gay, numa relação com imigrante sem documento, uma cadeirante feliz com filhos, uma ativista), de 2020 em diante.

Vemos a ascensão de uma Bolsonara, Vic (Emma Thompson), que não frequenta debates, faz suas lives, se lixa para os palestinos, coloca imigrantes em campos de concentração. A crise ambiental dá em enchentes. Ciberataques, em blecautes. Bancos quebram. Até a BBC é privatizada. Rola o fim do Estado de Bem-Estar Social. 

A família pergunta o que deu errado. A avó Muriel (Anne Reid), que nasceu no mundo analógico, atesta: A culpa é de vocês, que compravam camisetas por 10. A loja faliu. O produtor ganhava 1. O plantador do algodão, 0,1. 

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

Unplash: fotos para todos


De imagens históricas de soldados durante a Primeira Guerra Mundial a pinturas barrocas...

Mais de 1 milhão de imagens gratuitas de alta resolução trazidas a você pela comunidade mais generosa de fotógrafos do mundo.


domingo, 2 de fevereiro de 2020

Netflix, Abbey Road, Masp: tecnologia veio ajudar a democratizar a cultura


O acesso à cultura pode ser democratizado com a tecnologia (Pixabay)

Letícia Piccolotto | tilT

O debate sobre o papel e a importância do acesso à cultura tem sido intenso no Brasil e no mundo. Embora pouco se fale sobre o papel da tecnologia na promoção desse acesso, a área cultural tem sido uma das esferas em que mais percebemos essa transformação. Basta refletirmos sobre o modo como consumíamos música ou entretenimento nas décadas de 80 e 90 e como isso mudou radicalmente: a fita VHS deu lugar aos filmes e séries nas plataformas de streaming, como Netflix; os discos, CDs e MP3 foram substituídos por aplicativos, como Spotify e Deezer e os clipes de músicas que antes assistíamos apenas na TV hoje podem ser acessados a qualquer momento em diferentes canais.

É fato também que nos últimos anos as tecnologias têm ampliado o acesso de pessoas aos equipamentos de cultura, como museus e bibliotecas: já não é preciso sair de casa para ler livros e conhecer diversas obras de arte. 

Esse movimento tem estado cada vez mais em evidência: no ano passado, tive a oportunidade de participar do Web Summit, o maior evento de tecnologia do mundo, e lá havia um espaço inteiramente dedicado a discutir como a tecnologia tem transformado o mundo da música. Só para se ter uma ideia do potencial de disrupção, o estúdio mais famoso do mundo – Abbey Road Studio – tem hoje uma incubadora que funciona como um laboratório de inovação musical focado em apoiar startups que queiram repensar o futuro da música. A grande aposta é que a inteligência artificial trará uma nova revolução criativa para a indústria – assim como os sintetizadores anos atrás.

Aqui no Brasil também temos ações interessantes nesse sentido. Em dezembro de 2019, o Museu de Artes de São Paulo (Masp) lançou o aplicativo Masp Áudios para ampliar a experiência de visitantes ao acervo, a partir de realidade aumentada (augmented reality), adicionando informações ao que está sendo visto pelo visitante. Outro exemplo é o da Biblioteca Digital Mundial, um projeto apoiado pela Unesco e que permite o acesso gratuito à publicações históricas e raras de diversos países e instituições.

O papel das startups 

Nesse universo talvez o aspecto mais interessante das aplicações tecnológicas seja a democratização do acesso à cultura e o despertar de interesse do público: qualquer museu ou biblioteca tende a ser muito mais atrativo com a utilização de soluções interativas. E as startups que atuam no universo cultural usam as mais diversas tecnologias: realidade aumentada, gamificação, realidade virtual, experiências sensoriais, entre outras.

Localizada no Museu da Nova Zelândia, a startup Mahuki atuou como um hub de aceleração voltado especificamente para potencializar negócios inovadores em museus e patrimônios culturais. As ArtTechs também estão presentes na Europa, como a Artmo, startup dedicada a conectar o mundo da arte: uma rede social que une o público especializado e interessado, possibilitando o compartilhamento de conteúdo, a troca de experiências e também a compra de obras de arte. 

Nesse universo também há espaço para a atuação das GovTechs, startups que oferecem soluções para enfrentar os desafios do governo.

A Musemio, de Londres, é uma organização dedicada ao ensino cultural de crianças a partir do uso de realidade virtual (virtual reality), possibilitando a interação com os conteúdos de museus de várias nações do mundo.  

Um outro exemplo é a Árvore Educação, startup parceira do BrazilLAB, responsável pela criação da Árvore de Livros, a maior plataforma de leitura digital do Brasil, que conta com um acervo de mais de 30 mil obras on-line

A Tamanduá.Edu, startup selecionada para a 4ª edição do Programa de Aceleração do BrazilLAB, é uma outra iniciativa que contribui para o acesso à cultura, pois possui uma plataforma de conteúdos audiovisuais independentes (filmes, séries, curtas metragens) destinada aos alunos do ensino fundamental e ensino médio. A startup criou uma plataforma colaborativa que também disponibiliza conteúdo pedagógico utilizando os filmes como importante insumo de aprendizado e de ampliação do repertório cultural.  

Mas ainda há caminhos trilhar para garantir que a cultura possa se beneficiar de todo o potencial trazido pela conectividade e pela tecnologia.

Desigualdade ainda prevalece 

Os exemplos de como a utilização de tecnologias tem transformado a forma como se consome, produz e se divulga a arte estão aumentando com o tempo. Por reduzir as barreiras físicas, de custos e de informação, a internet e as tecnologias contribuíram para democratizar e diversificar toda a cadeia de produção cultural. Ainda assim, alguns desafios permanecem.

Primeiro, é preciso garantir infraestrutura adequada para a utilização das aplicações. Entram nessa lista equipamentos (hardware), mas também conexão de internet – um verdadeiro desafio para o Brasil. 

Além disso, é importante transformar o padrão de comportamento e consumo de informações na internet. A pesquisa "Panorama da Transformação Digital no Brasil", realizada pelo BrazilLAB em parceria com o Center for Public Impact (CPI), destaca que, apesar do brasileiro ficar em média 9 horas conectado a internet, este consumo é concentrado em atividades pouco educativas, principalmente o uso de redes sociais. É preciso investir no letramento digital da população e também na ampliação de repertório, incluindo os conteúdos culturais como objeto de consumo. 

Temos também um longo debate em relação à regulação no campo da cultura. Entram nessa discussão as plataformas de conteúdo em streaming, por exemplo. Se por um lado elas democratizam o acesso às produções musicais e audiovisuais, por outro, concentram e canalizam uma pesada audiência para determinados canais e conteúdos.  

A cultura aliada à tecnologia ainda pode ser considerada um fenômeno tímido, mas não há dúvidas de que está em ascensão e que precisa ser priorizado.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

O epidemiologista digital


Ninguém detecta mais rápido o surgimento e o comportamento de uma epidemia do que um computador

Pedro Doria | O Estado de S. Paulo

Enquanto boa parte do mundo se preparava para celebrar o Ano Novo, pesquisadores da consultoria canadense BlueDot disparavam um alerta para seus clientes. Havia um novo vírus na praça com potencial de se espalhar rapidamente. Os especialistas ainda apontaram para o epicentro: a cidade de Wuhan, na China. O Centro de Controle e Prevenção de Doenças americano deu o alerta em 6 de janeiro. A Organização Mundial de Saúde, no dia 9. A diferença entre os competentes organismos tradicionais e a BlueDot é só uma: inteligência artificial.

A BlueDot não foi apenas a primeira a avisar do coronavírus, que ontem fez a OMS declarar que estamos em estado de emergência de saúde internacional. Ela também previu, corretamente, que as primeiras cidades fora da China a perceberem casos do vírus seriam Bangkok, Seul, Taipei e Tóquio.

Já era previsível que este dia ia chegar. A última vez em que um vírus assim perigoso se espalhou foi em 2003 — a epidemia do SARS. O fundador da BlueDot, Kamran Khan, era um especialista em doenças infecciosas que trabalhava em Toronto, naquela época. A revista americana Wired o entrevistou. “Em 2003, percebi como o vírus tomou a cidade e pôs o hospital de joelhos”, ele conta. “Foi um processo de exaustão física e mental.” Ele criou a empresa para que isso não se repetisse.

O que chamamos de inteligência artificial é, na verdade, um tipo específico de IA. Aprendizado de máquina. Quando falamos de Big Data, aqueles grandes bancos de dados em geral desorganizados, apenas um apanhado de informações que não parecem fazer sentido no conjunto, falamos por causa de aprendizado de máquina. São algoritmos que buscam padrões que se repetem. Aí os identificam.

Para fazer um carro andar sozinho, o algoritmo acompanha vários motoristas dirigindo e compara com o que os muitos sensores do automóvel veem. Ao semáforo vermelho captado pela câmera, se os motoristas sempre param, ele aprende que deve parar. Se sempre que o radar detecta uma pessoa em movimento, o motorista pisa no freio — ele também fará isso. O software aprende os padrões dos dados que recebe, sinais dos sensores e comportamentos dos motoristas. Ao fim, criou-se um programa capaz de tornar um carro autônomo.

O que as muitas startups fazem é criar algoritmos de aprendizado de máquina para usos específicos. Como, no caso do doutor Khan, sua preocupação era alertar e prevenir doenças altamente infecciosas, foi para isto que dirigiu sua tecnologia. A BlueDot trabalha com três fontes para alimentar seus bancos de dados. O noticiário publicado por sites jornalísticos em 65 línguas diferentes, tráfego aéreo e relatórios de epidemiologia animal. Cruzando as notícias, às vezes apenas pequenas notas, com os relatórios de doenças infecciosas em animais, são capazes de perceber uma epidemia nascendo. Junte-se ao pacote o ir e vir de aviões e conseguem estabelecer, probabilisticamente, para que lugares estão indo as pessoas que foram expostas ao novo vírus.

O coronavírus não foi sua primeira história de sucesso. A BlueDot também previu o surgimento da zika na Flórida. Mas aquele foi um caso menor, localizado. Mais um teste de caso do que um exemplo comprovado. Agora já dá para dizer: ninguém detecta mais rápido o surgimento e o comportamento de uma epidemia do que um computador.

A partir de agora, será assim. Estas tecnologias estão entrando nas nossas vidas por todos os lados. Os nossos anos 20 que ora começam vão marcar o momento em que nos habituaremos a conviver com inteligências artificiais por toda parte. Muito em breve, vamos nos perguntar: como era mesmo que fazíamos sem?

sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

Não tem como dar certo


por Pedro Doria | O Estado de S. Paulo

Nas últimas semanas, assisti a alguns episódios de linchamento virtual no Twitter. Destes, uns particularmente violentos. Assisti ao linchamento de gente de esquerda, gente de direita, gente que nem tem qualquer coisa a ver com política. Não era assim, lá no início do Twitter. Foi ficando. E piorando. É, cada vez mais, a rede social onde se concentram os governantes, então faz parte de nossa conversa pública. Como sociedade, estes episódios indicam que estamos doentes.

Em inglês, uma série de expressões estão se consolidando para tratar deste processo. Cada uma tem significado ligeiramente distinta da outra, mas todas pertencem ao mesmo universo. A mais popular é cancel culture, que já entrou para o vernáculo brasileiro — cultura do cancelamento. Outra, a mais antiga do conjunto, é online shaming. Humilhação pública online. A terceira é call-out culture — numa tentativa de tradução, cultura do denuncismo.

Cancelar alguém na internet é promover um boicote. Em geral se volta contra artistas — trata-se de mobilizar um grupo grande o suficiente de pessoas para que deixem de seguir alguém por algo que tenha feito. No limite, o sucesso de um cancelamento ocorre quando se consegue destruir a carreira do alvo escolhido.

Humilhação pública é intuitivo — junte uma massa de gente para falar mal de alguém ao mesmo tempo. Denuncismo é parecido, só que mais específico. Ocorre quando a pessoa alvo de alguma forma cometeu algum delito de opinião. É a boa e velha patrulha ideológica, só que no ritmo da internet.

Estas ondas não ocorrem só no Twitter. Mas, da forma como o Twitter funciona, ele termina por ser um ambiente particularmente propício a ataques.

Tuítes são curtos, portanto há um limite para a quantidade de explicação que podem carregar. Com o celular na mão, a plataforma convida à impulsividade. Leu algo, quer responder na hora. Para uma mensagem sair torta, mal explicada, com duplo sentido, tudo é fácil de acontecer. A velha gafe da mesa de bar, que era esquecida e ficava restrita a uns poucos, no Twitter vira para sempre. Para não falar que é um ambiente generoso com os ressentidos.

Em parte, o problema é da plataforma. O Twitter não é uma rede para conversas — mas virou uma rede de conversas. Assim, um tuíte torto não pode ser editado para correção. E não adianta responder, explicar o que se quis dizer. Todo mundo vê o tuíte torto, mas quase ninguém vê a explicação embaixo. Além disto, exatamente como ocorre no Facebook, o algoritmo distribui mais aquilo que gera indignação. Ou seja: são os posts problemáticos aqueles que ganham mais visibilidade.

Só que não é só a plataforma. Vivemos um tempo muito moralista. A gente que conheço nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu um enxovalho, todos príncipes na vida — como escreveu, de certa feita, Fernando Pessoa. O moralismo de direita é aquele velho, que espera uma gente que se comporte nos limites do adequado dos anos 1950. O moralismo de esquerda é politicamente correto — há palavras interditadas, roupas, e uma penca de ideias.

Junte-se ao moralismo o tribalismo do tempo. Formamos tribos que têm interesses ou opiniões em comum. E a maneira de construir laços tribais, em geral, está noutra expressão que se tornou cotidiana em inglês. Virtue signaling. A sinalização de virtude. Quando alguém atenta contra os valores morais da tribo, todos precisam se manifestar acusando. Estão, em verdade, dizendo “faço parte deste grupo”, e para seus padrões sou limpinho assim. Para virar dezenas, centenas de milhares batendo numa só pessoa demora um segundo.

Neste mundo de limpinhos, príncipes na vida, o que criamos é uma sociedade de linchadores movidos a ódio. Não tem como dar certo.

quarta-feira, 22 de janeiro de 2020

Universidade de Aveiro disponibiliza acervo online com 2500 livros sobre África e Oriente


A biblioteca digital da Universidade de Aveiro já permite ler através da internet obras digitalizadas de Angola, Cabo Verde, Goa, Guiné, Macau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor.

O Portal das Memórias de África e do Oriente é um projeto da Fundação Portugal-África desenvolvido e mantido pela Universidade de Aveiro e pelo Centro de Estudos sobre África e do Desenvolvimento desde 1997. É um instrumento fundamental e pioneiro na tentativa de potenciar a memória histórica dos laços que unem Portugal e a Lusofonia, sendo deste modo uma ponte com o nosso passado comum na construção de uma identidade coletiva aos povos de todos esses países.

O projeto “Memória de África e do Oriente“ já tem online mais de 2500 obras, referentes à história dos países de Língua Portuguesa, durante a administração colonial. O projeto é executado pela Universidade de Aveiro e pelo Centro de Estudos sobre África e do Desenvolvimento (CESA) de Lisboa e tem contado com a participação de instituições de Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Goa.

Além de registos bibliográficos para orientação de investigadores e curiosos, estão agora disponíveis e com livre acesso obras digitalizadas que vão desde livros da escola primária do tempo colonial, a relatórios de antigos governadores das então colônias e outros documentos oficiais. Entre outras “preciosidades” já digitalizadas contam-se os três volumes da “História Geral de Cabo Verde”, várias obras do cientista e poeta cabo-verdiano João Vário, toda a coleção do Boletim Geral das Colônias, a revista do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa de Bissau Soronda (1986-2009), o Boletim Cultural do Huambo em Angola, e “O Oriente Português”, da responsabilidade da Comissão de Arqueologia da Índia Portuguesa, publicado entre 1905 e 1920 e retomado entre 1931 e 1940.

De acordo com Carlos Sangreman, da Universidade de Aveiro, o projeto “Memória de África e do Oriente” em dezembro atingiu 353.991 registos bibliográficos e 343.819 páginas digitalizadas e a base de dados já vai ser acrescentada. “Temos trabalhado com muitas instituições portuguesas, sendo a última a Biblioteca Nacional que nos disponibilizou 67 mil registos que irão ser colocados na base à medida que formos conseguindo compatibilizar o formato”, esclarece aquele responsável.

Acesse aqui http://memoria-africa.ua.pt/

via José Cristian Goés | A Pátria

segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

Radiohead lança biblioteca digital com acervo completo de músicas e mais


Nesta segunda-feira (20), uma novidade promete alegrar os fãs do Radiohead. O grupo disponibilizou uma biblioteca digital que contém o acervo completo de músicas e outros conteúdos da banda.

Sem precisar pagar para consumi-los, a Radiohead Public Library (RPL) possui faixas raras, fotos, clipes, singles, shows raros, textos e discografias na íntegra. É possível conferir até propagandas dos rockeiros.

O internauta pode fazer um registro de conta da biblioteca, para fazer pedidos de outros produtos. A loja conta com designs antigos de camisetas do Radiohead, as quais começarão a ser enviadas a partir do dia 3 de fevereiro.

Para completar, a iniciativa irá oferecer boletins digitalizados, capas de álbuns e um cartão do acervo, o qual se trata de um arquivo de imagem para download. A intenção é que o fã o imprima e cole uma foto, para criar um quadro.

Vale recordar: no passado, o líder da banda, Thom York, já chegou a esculachar os serviços de streaming da atualidade, como Spotify, YouTube e Apple Music. Para ele, essas plataformas roubam dinheiro dos artistas.

A Radiohead Public Library pode ser acessada por meio do site oficial da banda neste link.

Projeto de leitura tem 2,6 milhões de downloads




O “robô” do WhatsApp criado para distribuir livros infantis digitais, dentro do projeto Leia para uma criança, do Itaú Unibanco, alcançou mais de 2,6 milhões de downloads do PDF de três obras. Mais de 8 milhões de mensagens foram trocadas com o robô virtual durante a campanha. O projeto foi desenvolvido pelo Itaú, pela agência de publicidade DPZ&T, pelo Facebook e pela Take, que criou o “bot” que se comunicou com os pais interessados.

via O Estado de S. Paulo

terça-feira, 14 de janeiro de 2020

150 mil obras de arte de museus de Paris disponíveis online

André Cabette Fábio | Nexo

Iniciativa de 14 instituições agrega imagens de seus acervos, com licença Creative Commons para copiar, modificar e distribuir a obra 

DETALHE DO QUADRO “A APRESENTAÇÃO NO TEMPLO”, DE JACQUES DARET

No início de janeiro de 2020, a Paris Musées, uma instituição pública da cidade de Paris responsável por gerir 14 museus da cidade, liberou ao público o acesso e controle a milhares de obras que ficam em seu acervo.

As obras digitalizadas estão disponíveis na área dedicada a coleções do site da instituição, que existe desde 2016 e reúne mais de 300 mil imagens. Com a iniciativa, mais de 150 mil delas estão disponibilizadas com uma licença Creative Commons CC0, relativa a obras em domínio público. Isso significa que qualquer pessoa pode copiar, modificar e distribuir a obra, mesmo que para fins comerciais.

A iniciativa está alinhada à rede Open Glam, que reúne museus, bibliotecas e arquivos e os incentiva a divulgarem suas coleções online. Segundo o diretor para área digital, comunicação e desenvolvimento da Paris, Philippe Riviere, há uma equipe dedicada a avaliar quais imagens podem ser disponibilizadas com a licença CC0.

A ideia é disponibilizar as imagens também em outros bancos de dados abertos, como o buscador CC Search e a Wikimedia Commons.

Com a medida, imagens de artistas famosos, como Rembrandt, Gustave Courbet, Paul Cézanne e muitos outros passam a ser disponibilizadas. A imagem de cada obra é acompanhada de ficha técnica, com informações como data, autoria, dimensões e uma breve sinopse.

O site usa a imagens do quadro “A apresentação no templo”, de Jacques Daret, como exemplo da iniciativa. Pintada entre 1434 e 1435 para uma exposição na Catedral de Notre-Dame e atualmente no acervo do museu de Beaux-arts de la Ville de Paris, a obra retrata a Virgem Maria e o menino Jesus, em um templo decorado com cenas do Antigo Testamento.


terça-feira, 7 de janeiro de 2020

Impressos estão definhando e morrendo, mas o digital não tá com essa saúde toda



Por Luiz Fernando Aquino, para Coletiva.net
Imagem: Internet

Morreu no último dia de 2019, aos 36 anos, o jornal impresso Correio de Gravataí, fundado em 1983 e, desde 2012, propriedade do Grupo Editorial Sinos. Foi a sua última edição. Saiu da história do papel para buscar um lugar ao sol no sedutor mundo do digital. O on-line é o caminho, acredita a maioria. Trata-se de uma meia verdade. 

Dados do site Poder360 mostram que a circulação dos dez principais jornais do país, nos últimos cinco anos, caiu 51,7%, escorregando do 1,2 milhão de exemplares impressos por dia para 588,6 mil. Opa! Mas então o on-line é sim a salvação da lavoura?!? Não exatamente. Os mesmos números do Poder360 revelam que as assinaturas dos digitais não decolam na mesma proporção em que os boeings de papel despencam. 

Peguemos dois gigantes: Folha de São Paulo e O Globo. A Folha: em dezembro de 2014, eram 211.933 jornais diários; em outubro de 2019, 86.196. Redução de 59%. No digital (assinaturas), em dezembro de 2014, eram 159.117; em dezembro de 2018, 207.176. Ou seja, o digital da Folha cresceu 30%. O Globo, nesse mesmo período, registrou o seguinte comportamento: caiu 49% no impresso e subiu 31% no digital. Atenção! Estou considerando dados do digital até 2018, porque em 2019 o Instituto Verificador de Circulação (IVC) aplicou uma espécie de "pedalada contábil", alterando o critério sobre o que é "circulação paga" no on-line, catapultando generosamente esses números. Atentem para o seguinte: tanto os preços de anúncio quanto de assinaturas do digital são bem menores em relação aos impressos. 

A questão é: se o jornal impresso está com o pé na cova, por que esse gap de desempenho inverso dos digitais? É aí que a porca começa a torcer o rabo, como dizia o meu avô Damião. O digital surgiu como uma espécie de calçado 36 para um pé 42 dos jornalecões. Faça um teste agora: abra qualquer site desses grandes jornais. A capa é um tijolo. Vamos para os textos: as matérias têm o mesmo tamanho e linguagem dos impressos. Está tudo lá: título, linha de apoio, fotos quadradinhas, legendinhas bonitinhas e links, muitos links, muitos "saiba mais e leia mais", em uma infindável espiral de leitura - o novo Labirinto de Creta, só que sem o Minotauro. Percebem? A postura é rigorosamente igual ao padrão antigo das publicações, uma verticalização editorial afetada, soberana e pretensiosa, a mesma que está ajudando a arrastar para a agonia o impresso, entre outras razões de ordem econômica, claro. A clássica organização editorial está ali, travestida de moderna.

Ora, se o impresso despenca, e o digital não emplaca às ganhas, cadê o leitor/consumidor? Nas redes sociais. E qual a grande característica dessa danadinha? Horizontalidade, a sociedade se mexendo feito coisa viva, mas agora em rede (a rigor, sempre esteve, mas agora as pessoas também se falam). Leem o que lhes interessa (sem julgamentos nem preconceitos). Vida real, o dia a dia. Ah, mas ali só tem bobagens! É a vida de cada um, e daí? Mas isso colide com o jornalismo clássico/tradicional?!?! Não! Esse jornalismo clássico/tradicional é que está colidindo com a vida real, perdendo conexão, caindo no vazio, caretão, quadradão, dizendo, à sua maneira, o que interessa ao leitor, quase sempre ancorado em uma pauta oficialesca.

Na data de falecimento do agora saudoso Correio de Gravataí, pendura-se essa reflexão: como se livrar do mofo do terno da imprensa clássica/tradicional diante de uma nova mídia e de uma sociedade antenada, em movimento e em rede? Há um pulo do gato aí! Sempre há!

Luiz Fernando Aquino é jornalista e secretário de Governança e Comunicação e Social Substituto de Gravataí.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

Troca de cartas volta a ganhar adeptos e transforma-se em hobby na era digital

A jovem compartilha parte dessas experiências no canal Carolinaismo no YouTube, com vídeos de até 2 mil visualizações

Redação Folha Vitória


Foto: Divulgação

O primeiro passo é uma saudação, seguida de apresentação: quantos anos tem, onde mora, o que faz da vida, o que gosta de ler, de assistir, fazer. Depois, é o momento das perguntas para descobrir interesses em comum e, também, de acrescentar alguns mimos, como adesivos, recortes e afins. Esse passo a passo faz parte de um tutorial que, embora publicado no YouTube, tem objetivo mais analógico: ensinar a escrever cartas.

A troca de correspondência até deixou de ser um meio prático de comunicação, mas continua a ter milhares de adeptos no Brasil, tanto entre saudosos quanto entre aqueles que o adotaram já em plena era digital. Mais que isso: a tecnologia tem ajudado a atrair interessados por meio de blogs, sites, hashtags, grupos em redes sociais e até aplicativos.

"É uma forma de se desligar do ambiente veloz, de parar, sentar e escrever para produzir uma coisa à mão. Precisa sair de casa, ir nos Correios, postar a carta, esperar uma resposta. Sai do contexto de hoje em dia, em que tudo é uma correria", descreve Carolina Santiago, de 23 anos, mestranda em Literatura e moradora de Salvador.

Carolina começou a trocar cartas em 2017 e, hoje, mantém contato com cerca de sete "penpals" (amigos por correspondência, em inglês). "Não sabia que era uma comunidade tão forte nos dias atuais. Quando comecei, queria conhecer pessoas diferentes das que estava acostumada, de gerações diferentes, conhecer novas formas de pensar."

A jovem compartilha parte dessas experiências no canal Carolinaismo no YouTube, com vídeos de até 2 mil visualizações. Fora do País, publicações semelhantes chegam a passar as 900 mil visualizações. Elas são focadas especialmente em técnicas para escrever letras mais caprichadas e decorar cartas e envelopes com recortes de jornais e revistas, adesivos e itens afins.

Tudo isso ganha força com o crescimento do interesse por lettering, uma espécie de caligrafia que não precisa seguir regras ortográficas (como misturar letras cursiva e de forma, por exemplo), em que a escrita vira quase um desenho feito à mão. Outras tendências do mesmo nicho são o bullet journal e o scrapbooking, espécies de agendas e álbuns feitos à mão.

Grupos

Além de dicas, os interessados têm na internet a principal plataforma para encontrar pessoas para se corresponder, principalmente por meio de hashtags no Instagram, grupos no Facebook e sites especializados. Esse é o caso, por exemplo, do Envelope de Papel, que mantém site, perfil em redes sociais e um grupo de WhatsApp. O objetivo principal é apresentar breves descrições sobre pessoas que querem se corresponder, com interesses, hobbies, cidade natal e idade, dentre outras informações básicas.

"Em 2016, comecei a pesquisar na internet sobre cartas e aí encontrei um site internacional, que estava meio desatualizado. Não sabia se os endereços eram os mesmos. Comecei um grupo de cartas, passei a receber algumas e a me identificar com esse mundo", conta a idealizadora do Envelope de Papel, a publicitária mineira Mariana Loureiro, de 23 anos.

Hoje, a iniciativa reúne perfis de 585 pessoas de todos os Estados do País e alguns brasileiros que moram no exterior, com uma média de dez novas inscrições por semana, "sem divulgação", como ressalta Mariana. "A faixa etária é bem variada, tem jovens de 15, 20 anos, tem pessoas com mais de 50 anos muito ativas e um grupo infantil, de 7 a 14 anos", comenta.

A publicitária conta que se interessou por cartas e foi procurar mais informações online após uma conversa com o pai, que se correspondia com estrangeiros nos anos 1980. "A internet é essencial (para a popularização das cartas). A maioria das pessoas vai, em primeiro lugar, na internet para procurar."

A assistente técnica Ana Lúcia Abreu, de 51 anos, é uma das usuárias cadastradas do Envelope de Papel. "Antes, mandava cartas para pessoas que conhecia, que trabalhavam comigo. No Natal, mandava cartão para irmãos, tios, amigos mais chegados. Gosto da sensação de que alguém lembrou de você. A sensação é muito boa, de receber uma carta."

Ana Lúcia costuma escrever no fim de semana, especialmente nos fins de tarde e início de noite de domingo. "Deixo a coisa fluir. O melhor presente que a gente pode dar a alguém é o tempo, porque ele nunca mais volta."

Já a professora de Língua Portuguesa Lygea de Souza Ramos, de 36 anos, costumava se corresponder quando era adolescente e retomou o hábito há três anos. "Sempre foi uma coisa que me agradou muito, é uma forma de demonstrar carinho pela pessoa. Telefone, e-mail, é tudo muito imediatista, com mensagens curtas, não tem aquele tempo de elaboração como a carta."

"Pensar como fazer até a decoração da carta abre um universo muito diferente. Hoje tem um universo de papelarias enorme, uma infinidade de coisas que posso usar para decorar, trocar", conta ela, que se corresponde com cerca de dez pessoas. "Gosto de conhecer outras culturas, as pessoas se mostram mais por meio das cartas, o que gostam, o que fazem."

Versão digital

O hábito também ganhou impulso por intermédio do aplicativo Slowly, que simula a troca de cartas de forma virtual e tem cerca de 2 milhões de usuários mundialmente. O app propõe matches (combinações) com pessoas de interesses semelhantes (fotos de perfil não são permitidas), com as quais é possível trocar cartas virtuais - que podem levar até dias para chegar ao destinatário, a depender da distância geográfica.

"Em um app normal, geralmente a pessoa fala 'Oi, tudo bem', é difícil a coisa pegar. Fiz bons amigos assim, mas é uma coisa rara, precisa de muitas conservas para ter uma interessante. O Slowly Sé mais fácil, tem isso de não estar tentando conversar com um monte de gente ao mesmo tempo, de escrever como se fosse carta, com um monte de informação", comenta o mineiro Marcelo Fonseca, de 32 anos, professor de idiomas.

De férias fora do País, Marcelo pretende voltar a se corresponder em 2020. Uma das principais motivações é praticar idiomas com nativos. "Tinha de colocar no meu planejamento. Chego em casa às 20, 21 horas. Às 23 horas, sentava para escrever. O app passou a ser parte da minha vida, é uma coisa que você não para qualquer instante e responde. Tem mensagens que levei 1h30 ou mais escrevendo, tem de ser pensado." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

A revolução de bolso


por Leandro Karnal, O Estado de S. Paulo
Imagem: Internet

Escolher um fato marcante para um recorte de dez anos é perigoso e complexo. Algo que parece fundamental hoje, na perspectiva do fluir dos anos, fica deslocado do brilho original. Além do deslocamento de importância (podemos chamar de “paralaxe histórica”), existe um outro risco: o que é essencial para mim ou meu grupo é irrelevante para o conjunto maior. Exemplo: um fato que mudou a perspectiva da vida na Venezuela na década que se encerra foram os governos de Nicolás Maduro. Determinante para a Venezuela em qualquer sentido, o chavismo em crise afeta pouco outras áreas vitais do planeta. Tragédias impactantes, como os desastres das barragens de Mariana e Brumadinho, são absolutas para os envolvidos, enormes para o Brasil e quase irrelevantes para populações do Sudão do Sul, tirando a solidariedade humana básica.

Fui convidado para pensar qual seria o grande fato da década que termina. Rigor de historiador: o novo século não começa no ano “zero”, porém no ano um. Assim, a nova década, se formos muito rigorosos, começará em 2021. Porém, podemos começar a pensar no intervalo que nosso sistema decimal estimula. Qual acontecimento dos anos 2010-2020? Qual fato parece ter sido mais mundial do que local, mais permanente do que episódico, mais influente do que uma agitação na tensão superficial da água do tempo?

Faço uma escolha subjetiva ao extremo. Vou escolher uma tecnologia. Para esgarçar mais o rigor, uma tecnologia um pouco anterior ao recorte, todavia disseminada nele. O que seria? A coisa mais fundamental da década foi o uso coletivo do smartphone. Trata-se do celular conjugado a recursos de computador e com acesso à internet. O computador já tinha sido eleito “o homem do ano” em 1982, pela mesma revista Time que agora indica “pirralhas” para o posto. O uso generalizado de smartphones começa nos anos anteriores a 2010 e, na década escolhida, torna-se uma epidemia avassaladora. O smartphone ao alcance de todos é o grande fato.

Vamos pensar no exemplo da televisão. Experimental nos anos 1930, ela passa a crescer sistematicamente e se torna um dado dominante a cada novo ano pós-1950. O smartphone mudou a comunicação. Ele derruba aparelhos telefônicos fixos. Eliminou ou diminuiu o uso de lanternas, rádios-relógio, agendas, máquinas fotográficas, filmadoras, relógios de pulso, gravadores, calendários e muitas outras coisas. Sistemas de busca ao alcance da mão tornaram o smartphone uma memória universal portátil: a revolução de bolso. Hábitos de consumo foram mudados. Ir a banco pessoalmente virou sinal de idade. Cartas e telegramas foram tragados em mares de aplicativos. Tudo isso já tornaria o celular inteligente considerável, mas insuficiente para ser “o fato da década”. Há mais, muito mais.

O aparelhinho inovador tornou cada cidadão conectado e apto a ter determinada voz. Para o bem? Posso filmar uma violência, um problema, um abuso de uma autoridade e divulgar na rede. Não preciso conhecer o dono do jornal, um amigo na televisão: eu me torno editor, repórter, dono do jornal e cameraman. Quantos escândalos políticos nasceram de denúncias feitas com simples celulares? Para o mal? A intimidade devassada, pessoas filmadas em cenas sexuais, o “olho que tudo vê” atravessando toda porta. A aceleração do fim da ideia de público e privado. Uma revolução individual. É uma arma. Muitos manifestantes já avançam com o smartphone na mão, prevenindo-se contra algum ataque. O homem do Paleolítico erguia uma tocha bruxuleante diante do desconhecido lúgubre da caverna. O ser contemporâneo ergue seu smartphone no escuro do cinema.

Há mais: as consultas fáceis reinventaram o turismo. Há curadorias individuais, guias eletrônicos, indicações a todo instante. As consultas imediatas colocaram em questionamento a biblioteca como ponto de referência do saber. A conexão retirou as pessoas do contato olho no olho. A bateria em perpétua agonia estimula a dependência de tomadas e carregadores. Os acidentes, ao caminhar /dirigir, indicam, tragicamente, que conexão é considerada superior à vida e à segurança. A solidão foi ressignificada: todos estão acompanhados pelos smartphones. Difícil saber se o olhar total dos jovens sobre as telas seja causa de crise familiar ou a preservação de atritos. Sem serem obrigados à interação, os adolescentes conversam pouco.

O mercado musical foi revolucionado. A televisão aberta sofreu bastante. Jornais e revistas tiveram de se adaptar. Os aplicativos de busca de endereços mudaram a maneira de existir nas grandes cidades. Há quem assista a cursos, palestras e aulas na palma da mão. A política abandonou o palanque formal e esposou a telinha. Partidos pequenos cresceram com maior domínio do novo modus operandi. Dizem que eles foram as novas barricadas da primavera árabe. A Liberdade Guiando o Povo de Delacroix é, agora, uma antena de transmissão.

A dúvida é legítima. Por um lado, o smartphone tornou o humano mais livre, no sentido de encontrar respostas que antes demandavam mais consultas ou um especialista. Ao mesmo tempo, a maquininha transforma-se em uma muleta indispensável e há estudos mostrando que pessoas não conseguem dormir, comer, esperar ou até mesmo ter momento de descanso e intimidade sem elas. Ficamos mais autônomos ou mais autômatos? Übermensch ou zumbi? A humanidade teria se tornado um grupo frágil que pode ser reduzido a pó pela simples queda de uma rede?

Nada mudou tanta gente como a difusão do smartphone. Chegamos ao admirável mundo novo. Entramos no Éden ou fomos expulsos dele? Varia a resposta, mas o símbolo do processo continua sendo a maçã mordida. Que todos vivam bem em 2020, o que implica, hoje, boa conexão... e alguma esperança.

quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

Oscar Niemeyer tem acervo digital com mais de 500 trabalhos no site da Fundação Oscar Niemeyer


O último domingo, 15, foi dia de festa para a arquitetura brasileira. A data marcou os 112 anos de Oscar Niemeyer, nascido em 1907, e que morreu aos 104 anos, em 2012. Por conta de seu aniversário, a data virou também o Dia Nacional do Arquiteto e Urbanista.

Oscar Niemeyer foi uma das mentes mais brilhantes da arquitetura mundial e grande nome do modernismo. Ele esteve à frente de obras como o planejamento da cidade de Brasília, museus, centros culturais e igrejas espalhadas por todo o Brasil e outros países. Ele também foi responsável por projetar a sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, nos Estados Unidos.

Para quem quiser conhecer um acervo completo da obra de Niemeyer, a Fundação Oscar Niemeyer disponibiliza um acervo digital em seu site. São mais de 500 trabalhos.

Conheça mais sobre a Fundação Oscar Niemeyer:
http://www.instagram.com/f_oscarniemeyer
http://www.niemeyer.org.br/

Sopa Cultural

segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

O papel do jornal e a ausência das bancas

Cineasta argentino radicado no Brasil reflete sobre a rápida substituição do papel impresso e da leitura concentrada

Carlos Pronzato | Brasil de Fato

Prevalecem outros objetos pendurados, como brinquedos, artefatos tecnológicos baratos, lembranças turísticas e faixas de times de futebol / Pedro Carrano

Fico pasmo ao ver as antigas bancas de jornais do centro da cidade do Rio de Janeiro, especificamente na Cinelândia, Carioca e Lapa, no coração da antiga capital federal, substituírem aqueles objetos de papel impresso, que atravessaram séculos desde Gutemberg e acompanharam todos os passos da humanidade através do tempo, por prateleiras abarrotadas de biscoitos, chocolates e outras guloseimas e iguarias as mais variadas, normalmente mercadorias de supermercados, hoje comercializados até em farmácias!

Fenômeno atualíssimo e pernicioso que vem destruindo dia a dia aquele habito saudável - hoje obsoleto para muitos -, de concentração na leitura, em oposição à velocidade da informação instantânea, volátil e dispersiva de computadores e celulares.

Nem aquele útil costume - nas laterais e até pendurados na frente das bancas -, de colocar em exposição os tabloides convidativos para uma leitura informativa matinal, está conseguindo sobreviver. Prevalecem outros objetos pendurados, como brinquedos, artefatos tecnológicos baratos, lembranças turísticas e faixas de times de futebol. Processo similar sofrem as grandes livrarias, como a espetacular Livraria Cultura, por exemplo, que bem no estilo do El Ateneo, de Buenos Aires, restaurou e ocupou o antigo Cinema Vitória e teve que fechar suas portas. Embora outras como Da Vinci, Livraria da Travessa, etc., consigam permanecer no mundo real com a era digital no pescoço, incluindo cafés e atrativos lançamentos.

Não sei qual o diagnóstico neste preciso momento em cidades deste porte noutros países do mundo, mas o fenômeno parece estender seus tentáculos sobre a leitura dos jornais de papel, sem piedade. Por aqui se optou por trocar toda a mercadoria, embora mantendo a estrutura de uma tradicional banca de jornais, todavia perdendo a sua vocação original.

Depois destas quase minhas condolências, instalado já há algum tempo no apartamento de uma amiga no Rio de Janeiro, todos os dias me surpreendo pegando dois jornais de grande circulação por baixo da porta, dos quais ela tem assinatura. Confesso que até acordo mais cedo apenas para usufruir desta desintoxicante experiência de ler em papel durante o café da manhã.

Com todo o respeito a quem lê muito mais em computadores e celulares, da voracidade inútil de milhões de postagens e fake news em grupos de Whatsapp, incontáveis notícias sobre as quais apenas se pousam os olhos e outras milhares de curiosidades que morrem como borboletas, nada, até hoje, pode substituir a leitura no papel e a sua perene atenção - e conservação -, independente da qualidade do texto, como este que, caro leitor, está agora diante dos seus olhos, analógico como ainda é o ato de ler, tocar e respirar.