segunda-feira, 13 de maio de 2013

Conservação digital


A linguagem que está sendo gerada pelos escritores virtuais está longe de alcançar a dimensão e a riqueza do estilo de grandes autores celebrizados por livros impressos

Editorial | Diário do Nordeste

Apesar de serem maiores as facilidades para se publicar um livro na era digital, persiste séria dúvida sobre quando as descobertas tecnológicas serão capazes de assegurar, no futuro, a preservação do que hoje está sendo publicado. Não existe certeza sobre a integridade dos grandes acervos digitais ora em formação, após o passar do tempo. A própria biblioteca do Congresso dos Estados Unidos, considerada uma das mais modernas e bem equipadas do mundo, encara como um desafio o arquivamento dos livros digitais.

Até o momento, sabe-se que é mais fácil preservar um livro convencional do que outro produzido virtualmente. No caso de o papel não conter ácido nocivo, o livro impresso, mantido em baixa luminosidade e sob temperatura adequada, tem possibilidades concretas de durar mais de um século. O mesmo não acontece quanto à palavra digitada, que requer um complexo tratamento técnico, cuja eficiência duradoura ainda está longe de ser comprovada.

Ressalte-se que várias das mais importantes editoras, a exemplo da inglesa Macmillan, já anunciaram o propósito de não mais imprimir em livros convencionais os seus dicionários. A própria Enciclopédia Britânica já deixou de sair em papel. Existe a questão, inclusive, das edições anteriores dos livros, algumas de imensurável valor histórico, como o "First Follio" da biblioteca de Oxford, volume contendo 36 peças de William Shakespeare, ora em projeto de digitalização, mas ainda em boa parte bem conservado na forma original, apesar de sua publicação há séculos.

A preservação da história representa um dado sobremaneira importante nesse confronto entre as técnicas impressoras do passado e os processos digitais vigentes. Especialistas na preservação de livros alertam para problemas como o ocorrido com a Amazon, editora que, em decorrência de disputas sobre direitos autorais, apagou dois importantes livros do escritor George Orwell, "1984" e "A Revolução dos Bichos". Referido incidente causou o surgimento de uma gigantesca "nuvem computacional", denominação atribuída aos servidores remotos que guardam a memória do que se carrega eletronicamente.

Em decorrência desse fato, constatou-se o prejuízo que pode vir a acarretar o apagamento de uma dessas imensas "nuvens", com incalculáveis perdas para o registro tanto de anteriores civilizações como de interações entre o passado e o futuro dos povos.

Em paralelo à dificuldade de se encontrarem meios de preservar os acervos digitais, evidencia-se a facilidade de se publicarem livros com a utilização dos avançados recursos tecnológicos. Há publicadores que permitem a qualquer pessoa escrever um livro e colocá-lo à venda online, sem recorrer à intermediação, antes imprescindível, de agentes literários, editoras ou livrarias. Embora a maioria desses autores digitais não ultrapasse o limite de algumas centenas de exemplares vendidos, já ocorreram sucessos estrondosos como o de "Cinquenta Tons de Cinza", da escritora inglesa E. L. James, inicialmente surgido por meio de um publicador e, posteriormente, adotado por grandes editoras.

Algo é certo: a linguagem que está sendo gerada pelos escritores virtuais está longe de alcançar a dimensão e a riqueza do estilo de grandes autores celebrizados por livros impressos, nos quais a linguagem flui com a força e a extensão do pensamento, ou até do próprio inconsciente, conforme ocorreu em obras do gênio literário irlandês James Joyce, autor de "Ulysses". 


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