terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

AAAS lançará versão “open access” da Science


Herton Escobar / O Estado de S. Paulo

A revista Science vai ganhar uma irmã caçula em 2015. E atenção para a surpresa: ela será de acesso aberto e gratuito na internet, 100% digital!

O anúncio foi feito ontem pela editora-chefe da Science, Marcia McNutt, e pelo diretor executivo da Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS), Alan Leshner, por meio de um editorial (http://migre.me/hPJnW).

O nome da revista será Science Advances, e seu intuito, segundo o editorial, será dar vazão aos muitos trabalhos de qualidade que são submetidos à Science, mas acabam não sendo publicados por falta de espaço (ou outros critérios de seleção). Trabalhos que receberem um parecer favorável dos revisores mas não forem selecionados para publicação na Science, Science Signaling ou Science Translational Medicine (os três periódicos que compõem a família de revistas da AAAS atualmente) serão automaticamente considerados para publicação na Science Advances. A aceitação, segundo Marcia e Leshner, será determinada “exclusivamente pela qualidade do trabalho”.

O fato de a revista ser “open access” (com seu conteúdo disponível gratuitamente na internet) simboliza uma mudança significativa no papel exercido pela AAAS no cenário internacional de publicações científicas. A Science é uma das revistas de maior prestígio no mundo científico, mas tem sido criticada por conta de suas políticas editoriais e empresariais — assim como a Nature, a Cell e outras revistas de alto impacto que representam a “elite” da literatura científica mundial. Há reclamações de que a seleção dos trabalhos não obedece apenas a critérios científicos, mas também midiáticos, e questionamentos com relação aos valores cobrados para publicação e ao controle econômico que essas revistas exercem sobre conhecimento científico que, em sua maior parte, é gerado por pesquisas financiadas com dinheiro público.

Para entender melhor essa polêmica, leia também: Ganhador do Nobel adverte: revistas de alto impacto podem fazer mal à ciência.

“Para garantir a maior acessibilidade possível a autores e leitores, o novo periódico será de acesso aberto, com publicação financiada por meio de taxas de processamento autoral. Nesse modelo de publicação, o número de trabalhos que poderão ser publicados será limitado apenas pela qualidade das submissões. Com uma publicação exclusivamente digital, todos os trabalhos serão postados assim que estiverem prontos para publicação”, diz o editorial. “O objetivo é acelerar o processo de publicação, aliviar a carga de trabalho da comunidade de revisores e reduzir o risco de os autores terem de submeter o trabalho a outras revistas.” Segundo números divulgados pela AAAS, cerca de 14 mil trabalhos são submetidos para publicação na Science todos os anos, e apenas 800 a 900 deles são publicados (cerca de 6%).
A impressão é que a Science reconheceu a força do modelo de publicações “open access”, que cresceu substancialmente em importância nos últimos anos, e resolveu que não pode mais ficar fora desse segmento. Dessa forma, ela poderá manter seu nome associado a um grande número de bons trabalhos que hoje passam pelas suas mãos, mas acabam sendo publicados em outras revistas; reforçando, assim, o prestígio da marca, sem comprometer comercialmente o negócio da revista principal. O grupo da Nature seguiu o mesmo caminho recentemente, com a criação da revista Scientific Reports.

“O lançamento de um periódico irmão de certa forma alivia a pressão que os movimentos de acesso aberto exercem sobre um periódico de altíssimo prestígio e tradição como a Science“, avalia o especialista Rogerio Meneghini, diretor científico do programa SciELO. “Existe, porém, o posicionamento de governos, principalmente da Inglaterra e dos Estados Unidos, no sentido de impor que os artigos com autores destes países sejam obrigados a circular mundialmente em acesso aberto. Na minha visão isto vai acontecer dentro de algum tempo. Mas veja qual é a equação: 1) o grosso dos recursos para fazer pesquisa é público; 2) a parte dos recursos referente à publicação é paga pelo próprio autor, com recursos que ele consegue junto às fontes financiadoras, majoritariamente públicas; 3)  os grandes publishers certamente gastam muito dinheiro para publicarem seus periódicos e têm um papel importante neste sentido, mas não é admissível que tenham lucros anuais de 35-40%.”

Diante desse cenário, Meneghini prevê que todos os periódicos tenderão ao acesso aberto. “Os organismos financiadores governamentais vão financiar cada pesquisador com mérito não só para que ele realize sua pesquisa, mas também para que ele publique os resultados e que seus artigos sejam open access. A experiência mostra que os publishers comerciais funcionam melhor que os governamentais. Portanto, que eles operem obtendo lucros, mas que este seja de alguma forma limitado — seja pela concorrência ou por imposição.”

via Sistemas de Bibliotecas da UCS


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