sábado, 19 de novembro de 2016

As crianças e a necessária "dieta midiática"


Estudos científicos comprovam que a tecnologia influencia comportamentos através do mundo digital, muitos inadequados desde a primeira infância.

Eduardo Marcondes - O Progresso

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) divulgou há poucos dias um manual de orientação para médicos, pais, educadores, crianças e adolescentes que tem como tema "Saúde de Crianças e Adolescentes na Era Digital". No manual são abordados os principais problemas ligados ao uso excessivo da tecnologia por crianças e adolescentes. Entre as consequências estão o aumento da ansiedade, a dificuldade de estabelecer relações em sociedade, o estímulo à sexualização precoce, a adesão ao cyberbullying, o comportamento violento ou agressivo, os transtornos de sono e de alimentação, o baixo rendimento escolar, as lesões por esforço repetitivo e a exposição precoce a drogas, entre outros. Estudos científicos comprovam que a tecnologia influencia comportamentos através do mundo digital, muitos inadequados desde a primeira infância.

Existem benefícios e prejuízos advindos dessas tecnologias. O desafio é saber usá-las na dose certa. Nestes contextos, o pediatra tem um papel central, pelo respeito e confiança que recebe das famílias, pode ser o agente de mudanças ao orientar os pais a agirem diante de cenários de risco. Os pediatras podem programar com as crianças e adolescentes e suas famílias um plano de "dieta midiática" de acordo com as idades e desenvolvimento cognitivo e maturidade Da mesma forma, é importante orientar as crianças e adolescentes a se protegerem e terem conhecimento e todos os riscos.Como em qualquer plano de reeducação física ou alimentar, não basta o alerta ou a orientação do pediatra. É preciso do engajamento de pais, responsáveis e de professores para que os bons resultados apareçam.

O documento da SBP se baseou em quase 30 pesquisas científicas nacionais e internacionais. As primeiras orientações do Manual chamam a atenção para o tempo de uso da tecnologia digital, também denominado tempo de tela . Neste contexto, a SBP pede que esse período seja limitado e proporcional às idades e às etapas do desenvolvimento cerebral-mental-cognitivo-psicossocial das crianças e adolescentes. Além disso, nós pediatras desencorajamos e pedimos para que seja evitado ou até proibida a exposição passiva às telas digitais, com acesso a conteúdos inapropriados de filmes e vídeos, para crianças com menos de dois anos, principalmente, durante na hora das refeições ou nas horas que antecedem o sono. Crianças entre dois e cinco anos também devem ter o tempo de exposição limitado: no máximo uma hora por dia. 

Até os seis anos de idade, a orientação é para que as crianças sejam protegidas da violência virtual, pois não conseguem separar a fantasia da realidade. Jogos online com cenas de tiroteios, mortes ou desastres e que ganham pontos de recompensa não são apropriados em qualquer idade, pois banalizam a violência como sendo aceita para a resolução de conflitos, sem expor a dor ou sofrimento causado às vítimas. 

Aos adolescentes, a recomendação também é para que não fiquem isolados em seus quartos. Além disso, é preciso equilibrar as horas de jogos online com atividades esportivas, brincadeiras, exercícios ao ar livre ou em contato direto com a natureza.

Capítulo especial é dedicado a nossa especialidade, a pediatria. Devemos aproveitar a consulta para avaliar, aconselhar e orientar sobre o tempo de uso diário das tecnologias e celulares, videogames e computadores durante a consulta e correlacionar com os sintomas apresentados por crianças e adolescentes; Avaliar hábitos de sono, alimentação, exercícios, comportamentos e condutas com os colegas na escola, além do rendimento escolar e da dinâmica familiar. Outra proposta é programar com as crianças e adolescentes e suas famílias um plano de "dieta midiática" de acordo com as idades e desenvolvimento cognitivo e maturidade e ainda incluir nos protocolos de atendimento as rotinas que permitam tanto a prevenção como o diagnóstico e tratamento dos danos à saúde física, decorrentes do uso abusivo das tecnologias digitais. O advento da tecnologia é irreversível. Cuidemos todos (pediatras, pais, professores) para que esse progresso seja saudável para as nossas crianças.

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