terça-feira, 29 de outubro de 2019

50 anos esta noite

Espírito livre, aberto e de colaboração: são características da internet, cuja origem começa na Arpanet, que começou a funcionar há exatos 50 anos

Demi Getschko | O Estado de S. Paulo

O professor Leonard Kleinrock, da UCLA

Gostamos de poder associar um evento marcante a uma data. A internet que conhecemos é a evolução do projeto de rede Arpanet, iniciado nos Estados Unidos em 1966, e que deu o primeiro sinal de vida em 29 de outubro de 1969, às 22:30, quando dois computadores diferentes e distantes entre si trocaram a primeira mensagem. Esse momento está gravado em placa na sala 3420 do prédio Boelter, da engenharia da UCLA (Universidade da Califórnia, Los Angeles). Ainda hoje, a sala é ocupada pelo pesquisador e pioneiro de redes Leonard Kleinrock.

A Arpanet foi desenvolvida dentro da Agência de Projetos Avançados de Pesquisa (ARPA, na sigla em inglês) com recursos do Departamento de Defesa norte-americano, que em 1966 alocou US$ 1 milhão para um projeto de rede que conectasse computadores de fabricantes diversos usando “comutação de pacotes”, tecnologia então desenvolvida por Paul Baran e Leonard Kleinrock. 

A rede resultante deveria resistir a quedas de linhas e de nós. Uma rede como a telefonia tradicional baseia a troca de dados entre dois pontos num caminho definido e único (“comutação de circuitos”). Uma ruptura nesse caminho porá a conexão a perder. Por outro lado, a “comutação de pacotes” utiliza uma malha de caminhos, com a mensagem dividida em pequenos pacotes de dados. Uma queda de linha ou nó resultará, no máximo, na perda de alguns pacotes, mas a comunicação continuará possível. É a base da resistência a falhas que a internet apresenta.

Se nos anos seguintes surgiu uma pletora de redes de computadores a Arpanet prevaleceu a todas. Por ser independente de fabricante, por ter padrões abertos a disponíveis, por ser simples, por não ter um centro de controle, por ter mecanismos de recuperação de erros na transmissão, e por se basear em cooperação. Essas características ficaram definitivamente marcadas quando migrou definitivamente, em 1 de janeiro de 1983, de seu protocolo inicial NCP, escrito por Steve Crocker, para o TCP/IP. 

O projeto do TCP/IP fora iniciado em 1972 por Robert Kahn e Vinton Cerf. Com o sucesso do IP (Internet Protocol, ou “protocolo entre redes”), que funcionou como “cola” entre todos os componentes da rede global, o nome “internet” foi adotado para a rede. O IP permite que redes autônomas unam-se voluntariamente à internet, sem ter que abrir mão de suas políticas administrativas.

Falando em espírito livre, aberto e de colaboração, características da internet, é curioso notar que, há também 50 anos, ocorreu outro evento distintivo: o festival de música de Woodstock reuniu 200 mil jovens participantes e sinalizou a tendência libertária.

A Arpanet nasceu com financiamento militar, mas rapidamente redes acadêmicas passaram a integrá-la. A partir de 1980, com a implantação do TCP/IP, mais e mais redes passaram a constituir o tecido global. Ficou claro que a rede se tornara muito mais abrangente que seu objetivo inicial e chegara a hora de sua despedida. O bastão estava sendo passado à sua pujante filha, a internet.

Assim, em 28 de fevereiro de 1990 a Arpanet foi considerada definitivamente desligada. Vint Cerf escreveu um tocante “Réquiem para a Arpanet”, que traduzo livremente: 

“Foi a primeira e, sendo assim, também a melhor,/mas vai agora descansar para sempre/Detenha-se comigo e derrame algumas lágrimas./Em seu canto de cisne, por amor, por anos e anos/de serviço bem feito e fiel, eu choro./Deite seu último pacote agora, amiga, e durma”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário