quinta-feira, 1 de março de 2012

Na Biblioteca Nacional de Portugal a estratégia é desmaterializar obras para disponibilizar on-line



Pedro Miguel Fernandes e Paulo Rodrigues | iGOV 


Para uma instituição histórica como a Biblioteca Nacional de Portugal (BNP), as tecnologias têm vindo a tornar-se um importante aliado… para encurtar as distâncias que separam livros e leitores. A plataforma de eBooks lançada recentemente acaba por ser mais um passo no longo percurso de modernização tecnológica que a Biblioteca Nacional iniciou há muito. O caminho de informatização iniciado em 1987 tem vindo a dar os seus frutos. Com a Internet começaram a ficar on-line os catálogos bibliográficos, em 2002 nasce a Biblioteca Nacional Digital, em 2010 surge a Livraria Eletrônica e, agora, é lançado o serviço de eBooks. Este foi o pretexto para a entrevista a Maria Inês Cordeiro, subdiretora-geral da BNP. Uma conversa que revisita o passado das tecnologias de informação na instituição e sugere as orientações para o futuro.


Como funciona o serviço de eBooks da BNP?


Este serviço de eBooks funciona numa plataforma eletrônica nova associada à livraria eletrônica, que já existe desde 2010. Na prática, dá à pessoa a possibilidade de adquirir em formato eBook o mesmo livro que existe impresso, para poder utilizar em plataformas móveis ou no seu computador.


Há três anos era uma ideia e hoje já é uma realidade que vem na linha de uma série de pequenos passos de modernização que a Biblioteca Nacional de Portugal tem vindo a fazer na qualidade de editor.


Que edições estão disponíveis na plataforma de eBooks?


Só são disponibilizadas as edições da Biblioteca Nacional porque esta é uma atividade da BNP enquanto editor. A BNP é um pequeno editor de grandes livros. Tem publicado uma média de dez a doze edições por ano.


Neste momento, já disponibilizamos na plataforma cerca de 50 obras, o que equivale aos últimos cinco anos. E esperamos, muito em breve, disponibilizar mais cinco anos de edições. Ou seja, brevemente, vão estar disponíveis na plataforma de eBooks os últimos dez anos de edições da Biblioteca Nacional.


Quais são as principais vantagens do serviço para a BNP?


Por um lado, é a modernização de uma área de atividade que tem tido grandes mudanças na indústria nos últimos anos, com o objetivo de fazer chegar mais longe as nossas edições. É ter mais canais, é ter mais clientes e é dar mais visibilidade àquilo que nós publicamos. E isso é um dos grandes objetivos de qualquer editor.


Por outro lado, tem ainda um outro objetivo, que não é demais sublinhar, que visa acompanhar com experiência prática aquilo que são as transformações da indústria de edição.


Somos um pequeno editor, mas ficamos a conhecer as questões e a ter essa experiência prática. E isso é muito importante porque a BNP recolhe, armazena e conserva todo o patrimônio bibliográfico nacional. Se a BNP tiver experiência prática como editor, nomeadamente ao nível dos novos formatos, é óbvio que isso tem muita utilidade na sua relação com a indústria de edição.


Para esta atividade da BNP, enquanto entidade que conserva a coleção e a memória bibliográfica nacional, é muito importante que tenha uma boa interligação com o universo dos editores. Estes são desafios que se levantam à edição actualmente e, portanto, é de todo o interesse que a BNP, mesmo sendo um pequeno editor, esteja completamente inserida nesse contexto.


Em que medida as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) têm vindo a alterar o funcionamento de uma instituição como a BNP?


Na BNP, a primeira geração de informatização deu-se em 1987, altura em que muitas outras bibliotecas portuguesas avançaram com projectos de informatização. Um processo que, desde essa altura, tem tido uma evolução enorme.


Em termos de informatização dos catálogos da BNP, o primeiro resultado mais visível deu-se com a emergência da Internet, quando começou a ser colocado on-line o catálogo das bibliotecas. Isso deu às pessoas a possibilidade de pesquisar o catálogo a partir de casa, a qualquer hora do dia ou da noite.


Mais recentemente, a partir de 2002, começou a ser construída a Biblioteca Nacional Digital. Este foi outro grande passo de transformação. Este é um projeto que continua a ser construído constantemente, dia-a-dia, paulatinamente… Vai-se construindo uma biblioteca por transposição de parte do acervo físico para o ambiente digital. Digitalizam-se os livros (as obras que estão no domínio público e que não carecem de obtenção de direitos) que ficam livremente disponíveis a toda a população, quer seja leitora BNP ou não.


Este é um projeto com um enorme impacto internacional, devo dizer. No último ano, de 2011, os acessos e consultas aos objetos digitais (acessos de utilizadores às obras com um mínimo de um minuto) ultrapassaram os oito milhões. Isto é qualquer coisa que corresponde a cerca de vinte anos do serviço que providenciamos localmente na sala de leitura geral da BNP.


Por isso, e sem sombra de dúvidas, a direção a tomar em termos de investimento e de modernização vai no sentido de desmaterializar e colocar na Internet utilizável por qualquer pessoa, de qualquer idade, do país ou do estrangeiro, os bens culturais que temos aqui à nossa guarda.


Claro que isso não se aplica a todas as obras, porque há imensas questões que se colocam às obras que são órfãs ou que ainda são protegidas por direitos de autor. Mas, de fato, há todo um manancial de cerca de oito séculos de materiais que nós podemos disponibilizar ao público.


É um trabalho que se faz lentamente porque requer um grande investimento. Mas é decisivamente um investimento com um retorno enorme que muitas vezes passa despercebido a cada um dos utilizadores que consultam o nosso acervo.


Mas os projetos de modernização com informatização não se esgotam aqui. Desde princípios de 2009, por exemplo, o utilizador que vem à BNP pode requisitar os livros, escolher o seu lugar na sala e saber o tempo de espera inteiramente através da Internet, diretamente no catálogo. Este é um processo fácil e que não exige o preenchimento de senhas. Daí que o tempo de espera pelas obras na sala de leitura geral raramente exceda os 15 minutos, o que é muito bom para quem tem um acervo de mais de 50 km de prateleiras.


Que projetos para o futuro?


Para breve estamos a preparar o lançamento de um serviço novo a incluir no catálogo, a par de outros serviços que já disponibilizamos. Temos a digitalização a pedido, um serviço que é comum e partilhado por mais cerca de 15 bibliotecas dispersas por toda a Europa. Existe um botão no catálogo que permite às pessoas pedirem a digitalização da obra e comprá-la totalmente on-line, incluindo receber o ficheiro, fazer o pagamento, etc.


Dentro de muito pouco tempo vamos também no catálogo a possibilidade de a pessoa pedir a impressão a pedido. Ou seja, a digitalização com impressão. E o utilizador recebe o livro totalmente preparado com uma impressão a pedido, com capa e a indicação do acervo respectivo. Existem, de fato, utilizadores que querem ter a impressão de um livro que está digitalizado.


Um outro projeto que temos em fase final é o novo interface da Biblioteca Nacional Digital, que tem neste momento cerca de um milhão e meio de páginas e cerca de 24 mil obras disponibilizadas. Chegamos a uma fase em que já concluímos a remodelação da infra-estrutura, a remodelação dos processos de trabalho e, finalmente, vamos agora remodelar o interface em que os livros são lidos e manuseados.


O interface vai ser completamente diferente daquele que existe hoje que é muito estático e de navegação página-a-página. Pensamos que este novo interface vai ter um impacto muito positivo na comunidade cultural em geral. O universo de pessoas e entidades que consulta as bibliotecas digitais é muito variado e nem sempre é possível caracterizar muito bem. Portanto vamos renovar este último nível da Biblioteca Nacional Digital, que, pensamos, virá a ter muito impacto.


Por outro lado, estamos agora a iniciar a concepção de algumas linhas de atuação específicas para nichos de utilização do acervo digital, que passa por ter guias ou formas de exploração do universo bibliográfico que disponibilizamos on-line interligados com as entidades mais vocacionadas para determinados grupos.


Estou a pensar, por exemplo, nas escolas em primeira mão. Eventualmente, nós achamos que existem audiências específicas para as quais nós talvez tenhamos de criar guias orientadores e fazê-lo em cooperação com algumas comunidades específicas. Sempre na óptica de fazer com que as comunidades tirem o maior partido possível do patrimônio que colocamos em linha.

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