sexta-feira, 26 de abril de 2019

Um Twitter muito diferente

Se é nas redes sociais que se dá o debate político, é preciso que ele estimule o avanço das ideias

Pedro Doria | O Estado de S. Paulo

Fundador e presidente da rede social, Jack Dorsey é o homem por trás das mudanças do Twitter

Na tarde da terça-feira, o presidente executivo do Twitter, Jack Dorsey, entrou no Salão Oval para uma conversa com o presidente americano, Donald Trump. Foi Trump quem o convidou. Dorsey, que quando em público costuma se vestir muito informal, usa uma barba espessa e tem uma pegada hipster, estava de terno e gravata. Muito pouco foi divulgado a respeito da conversa. Mas o Washington Post ouviu de uma fonte que, por um longo tempo, Trump se queixou da perda de seguidores. Ele parecia acreditar que há uma política não declarada da plataforma de diminuir seu tamanho online. Dorsey, por outro lado, gostaria de ter falado mais sobre a qualidade das conversas.

É bem menor do que o Facebook, o Twitter. Segundo estimativa, fechou o primeiro trimestre com 330 milhões de usuários ativos por mês contra 2,37 bilhões da rede de Mark Zuckerberg. Mas é a plataforma favorita de Trump por lá, de Bolsonaro aqui, é quase uma unanimidade entre jornalistas, inúmeros cientistas políticos, assim como economistas. É a rede onde fervilham conversas de interesse público como nenhuma outra, é onde batalhas políticas são travadas. Pode ser menor que o Facebook, mas é profundamente influente.

No início do mês, Dorsey se sentou no palco do TED em Vancouver, no Canadá, para ser entrevistado durante 25 minutos pelo curador do evento, Chris Anderson. Assim como o Facebook, sua empresa está sob pressão, tendo de encarar questões ligadas a abuso e agressividade, informação falsa, e a toxicidade geral do debate político. Diferentemente de Zuckerberg, porém, Dorsey está desenhando em público um conjunto claro de metas sobre como mudar. Caso realmente execute o que promete, em alguns anos o Twitter será um bicho muito diferente do que é.

Redes sociais podem não parecer, mas são programas de computador. O tipo de interação que ocorre nelas é resultado dos incentivos que os arquitetos nelas puseram. Assim, destaque para o número de seguidores, de retuítes, de likes, dá a medida do que buscam seus usuários. É um jogo de números. E muito rápido todos aprendem que quanto mais indignação provoca um tuíte, quanto mais rábicos os debates, quanto mais emoções intensas são postas nas conversas — mais seguidores, retuítes e likes. Mudar quer dizer criar números muito distintos para acompanhar.

O Twitter já sabe quais serão estes novos medidores. Em conjunto com o MIT, chegou a quatro indicadores que se concentram em conversas acontecendo na rede. O primeiro é atenção compartilhada. O quanto do diálogo trata do mesmo assunto. Depois, realidade compartilhada. Ou seja: quanto das pessoas conversando partem dos mesmos fatos — mesmo que discordem das conclusões. Daí receptividade. Se o bate papo é educado, se avança com civilidade. E o quarto é variedade de opiniões a respeito do tema, desestimulando a formação de bolhas.

Agora, os engenheiros estudam como calcular cada um destes indicadores. Não é simples. Na sequência, antes de implementar, passarão um tempo avaliando como os quatro números se relacionam entre si. Afinal, por vezes quanto maior a variedade de opiniões, por exemplo, menor a concordância a respeito dos fatos essenciais do tema. É a partir deste aprendizado que Jack Dorsey pretende reinventar o Twitter.

Sua preocupação é a de todo mundo: se é nas redes sociais que o debate político se dá, é preciso que este debate realmente estimule o avanço das ideias. Mais encontros, menos separações. Mais trocas, menos carnificina. Talvez, quem sabe, daí outros tipos de políticos chamarão mais atenção.

Um comentário:

  1. Muito interessante! Se funcionar vai ajudar a diminuir o ruído> Valeu a postagem.

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