sexta-feira, 4 de junho de 2010

E-books ameaçam a existência do livro impresso?

O livro de papel vai mesmo morrer, como rezam os nerds mais extremistas? Você, eu, Umberto Eco e mais uma legião de leitores acreditamos que não. Em sua obra mais recente, lançada no Brasil em maio, o filósofo, semiólogo e linguista italiano defende sua opinião sobre o assunto logo no título: “Não contem com o fim do livro” (Ed. Record). “O livro, para mim, é como uma colher,um machado, uma tesoura, esse tipo de objeto que, uma vez inventado, não muda jamais”, disse ele, em entrevista recente. E completou: “Eletrônicos duram dez anos; livros, cinco séculos”.

Não é de hoje que se apregoa o fim do livro. Há várias décadas, Walter Benjamin profetizava, com seu bigode indefectível: “O livro, na sua forma tradicional, encaminha-se para o seu fim.”

O tempo passou e presenciamos a sobrevivência do livro físico, até porque não há e-book capaz de suplantar a magia da página impressa. Ou será que estamos sendo ingênuos?

Leitor aponta vantagens do livro virtual

“O livro é tão imortal quanto a roda. Não é à toa que os dispositivos de leitura tentam imitar o conforto e a mobilidade do papel”, diz o jornalista Elias Pinto, 50 anos, colunista e crítico literário do DIÁRIO DO PARÁ. Imerso em sua biblioteca particular de mais de dez mil exemplares, ele se sente o personagem do conto “A Casa Tomada’, de Julio Cortázar: “É tanto livro que isso aqui parece um labirinto. Eles já tomaram os quartos, a sala... Para chegar ao computador preciso andar me esgueirando. Se preciso de algum título, é mais fácil comprá-lo de novo do que encontrá-lo nesse ringue”, brinca.

A geração de Elias ainda cultua o livro impresso. “Eu leria ‘Guerra e Paz’, ‘Ulisses’ ou ‘Grande Sertão: Veredas’ num leitor eletrônico?”, questionase. “Claro que não sou refratário quanto à tecnologia. Até quero um Ipad, um Kindle, mas só se me derem de presente”, ri.

Para o publicitário Gustavo Nogueira, 22, planner de comunicação digital, buscar e ler conteúdo na tela já virou rotina. “Estou acostumado. Se não fossem os e-books, eu não teria acesso a muitas obras técnicas da minha área. A internet me possibilita a praticidade de ter o livro a um clique”, diz. E completa: “Arrisco dizer que, com as novas plataformas,vamos ter cada vez mais leitores de cápsulas de conteúdo, como notícias em sites e textos em blogs. Para prender esse novo leitor em grandes quantidades de texto, será necessário oferecer imersão além do texto, através da interatividade e de outros recursos que o digital possibilita”.

Para Elias, contudo, essa multiplicidade de recursos pode representar um problema. “A ânsia por conhecimento diante do conteúdo virtual acaba por ser tão rasa quanto a tela de um monitor. Quando se quer clicar, clicar, não existe um momento de reflexão mais profunda”, acredita.

A verdade é que, enquanto se desenrola a discussão, os leitores eletrônicos como Kindle e Ipad – cuja popularização é fundamental para a difusão da leitura de e-books - ainda são raridade no Brasil. Um relatório elaborado em 2009 pela Comissão do Livro Digital da Câmara Brasileira do Livro aponta que o uso destes dispositivos ainda está restrito a uma camada de usuários iniciantes amantes de tecnologia – os chamados hard users -, e só ganhará massa crítica conforme baixem os custos dos equipamentos.

Unindo forças

Na última quarta-feira, 1º, uma notícia aqueceu ainda mais a discussão sobre o futuro do livro: as cinco maiores editoras de livros do Brasil anunciaram a criação de uma plataforma para distribuição de e-books: a Distribuidora de Livros Digitais (DLD). Juntas, Objetiva, Record, Sextante, Intrínseca e Rocco atuarão na distribuição de e-books para livrarias on-line e empresas de conteúdo digital, além de oferecer seus serviços a outras editoras interessadas no novo negócio.

É o início da transformação do mercado editorial brasileiro, que ingressa aos poucos – e sem pressa nenhuma - no mundo digital. Esse processo deve acelerar com a popularização dos aparelhos de leitura, como o Kindle, o iPad e o Cool-er, primeiro e-reader do Brasil, com preço sugerido de R$ 750.

Praticidade

Em Belém, só é possível comprar os leitores eletrônicos por meio da internet. Sílvia Bahia, 47 anos, é professora universitária de literatura e língua inglesa. Para não sair de casa com a bolsa abarrotada de livros, adquiriu um kindle em 2008. “Hoje tudo o que preciso para ministrar as aulas está no aparelho”, diz. E não foi só a praticidade que motivou a compra. “Quem gosta ou precisa ler literatura estrangeira sabe que ter um livro digital é muito mais barato do que ter a obra em papel, além da vantagem de receber o livro em tempo real”, diz ela, que além dos livros acadêmicos, tem no dispositivo títulos de poesia, romance e computação, até guias de viagem.

Incômodos na leitura? De jeito nenhum. “Embora folhear um livro físico seja um prazer, nós, professores, estamos acostumados a ler revistas científicas em pdf ou em versões eletrônicas no computador. Experimentei outros e-readers, mas confesso que estranhei. No caso do kindle, a tela adaptada, opaca, torna confortável a leitura, apesar da paginação diferente. Você pode escolher o tamanho da letra, pode ‘ouvir’ o livro em vez de ler... são muitas as vantagens. Gosto tanto que, em alguns casos, mesmo já tendo o livro em casa, busco o meio digital. Assim fico com um para consultas rápidas e posso levar o outro comigo, pra ler no avião, no hotel, aonde eu for”, conta. Gustavo também compartilha desse comportamento: “Não deixo de lado a experiência da leitura dos meus livros preferidos no papel. É com eles que aproveito os poucos minutos que passo longe da tela do meu notebook”.

Fonte: Diário do Pará

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